Em um desses dias que parecem ridiculamente curtos em relação à quantidade de tarefas que se precisa fazer, estava lá eu presa em mais um engarrafamento, com muitas pessoas estressadas buzinando como se isso fosse magicamente tornar o trânsito mais eficiente, xingando umas às outras, desejando poderem abandonar os carros ali e seguirem o caminho andando. Como uma praticante fervorosa do “ficar de boa com a vida”, eu coloquei a minha banda favorita para tocar, olhei aquela vastidão de prédios atrás de prédios e de linhas cortando o céu e peguei-me a pensar que eu poderia estar lendo um daqueles livros que fui deixando pela metade ao longo do ano.
Uma memória particular veio-me à mente: “Eu não consigo mais terminar de ler os livros que começo”, disse-me uma amiga que costumava ser leitora assídua. Assim como eu, essa minha amiga – a quem chamarei de S. – descobriu que estava muito apaixonada pelo curso e pelo ambiente da universidade para focar-se em concluir as leituras pendentes. Mais do que isso, descobriu que adentrar a vida adulta significa assumir muitas responsabilidades consigo mesma e com os outros. Descobriu até mesmo que organizar uma festa envolve muito mais estresse e discussão do que
diversão de fato.
Em meio à quantidade de conhecimentos novos a que somos bombardeados – você, eu, a S. –, como conseguir manter a concentração estática em algo por mais de uma hora? Eu costumava pensar que jamais seria afetada por esse problema. Era simples desligar a atenção dos feeds de notícias, das atualizações nas mais diversas redes sociais, ao barulho irritante da janela do MSN avisando que alguém estava me chamando. Mas, essa era uma época diferente. Eu era diferente – não tinha interesse em festas, em garotos, em pulseiras e brincos, nem gostava da ideia de passar o final de semana fora de casa. Na verdade, eu gostava bastante da ideia de passar um mês inteiro em casa, à
disposição das minhas leituras, sem um mundo além do meu quarto para me perturbar.
Agora, travo longas batalhas para decidir quais são as minhas prioridades. Todos os dias, tanto a S. quanto eu, acordamos e percorremos o dia pulando de uma distração à outra, perdendo tempo com pequenas coisas, ao invés de fazermos aquilo que deveríamos, porque há sempre aquele famoso dilema “eu não vou ter tempo o bastante para me dedicar a isso, porém terei tempo o bastante para ficar entediada sem fazer nada”. O resultado é que, geralmente, escolhemos conferir qual a novidade do momento. Abrimos o facebook, o whatsapp, o instagram, *insira aqui o nome da rede social ou aplicativo que você usa com frequência*, e passamos alguns minutos fazendo absolutamente nada de produtivo. Então, quando há enfim tempo livre, este é o tempo que reservamos para estudar, para irmos a grupos de estudos e palestras, para sairmos com os amigos e ficarmos à toa conversando. Na hora de voltarmos para casa, já é tarde, estamos cansadas, mas ainda há trabalhos para serem feitos, ensaios para serem revisados, matéria acumulada de Fisiologia (porque é impossível estar com ela em dia, mesmo que a sua universidade entre em greve!), e há ainda mais novidades – a foto que uma amiga postou, o aviso que um professor deixou de última hora no e-mail da turma, o texto interessante que acabou de sair num site, a atualização que o computador decidiu que precisa ser feita agora...
Não culpo a minha amiga por não conseguir manter o seu interesse num livro. Não lembro as palavras exatas que falei para a S., mas foi algo do tipo: Eu acredito que cada livro tem o momento certo para ser lido. Às vezes, você está muito agitada para se dedicar a um livro mais denso; não importa o quanto você queira o ler, você não irá aproveitá-lo. Então, você tem duas opções: ou você acredita que estou certa e espera pelo tempo certo na sua vida, sendo que este pode nunca chegar, porque as responsabilidades só tenderão a aumentar e o tempo livre a diminuir proporcionalmente; ou você me diz que sou louca e que acredita no contrário, que a gente deve encontrar brechas ao longo do dia para nos dedicarmos àquele livro que queremos muito ler, independente do tamanho e da complexidade dele.
Acho que a S. escolheu acreditar nessa história de esperar o tempo certo, enquanto eu resolvi que não tenho mais tempo para isso. Eu posso demorar um mês para terminar um livro de 300 páginas, porém, ao menos, estou tentando vencer a distração barulhenta da vida cotidiana. Alguns detalhes, são indispensáveis; outros, contudo, eu posso passar vinte minutos a uma hora sem perceber que faz falta.
Postagem feita por:
Isabelle, pseudo-escritora, sonhadora, tento fazer poesia, mas acabo aglutinando demais minhas palavras e tudo vira prosa com toque de melancolia. Deixe-me, que ainda estou aprendendo o ofício. Tenho 18 anos vividos como um sopro e aquela sensação ruim de que tudo está acontecendo rápido demais. Fora isso, gosto de música, de livros, de filmes e de todos os clichês de sempre.
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